VIVEMOS ÀS MARGENS OU FOMOS COLOCADOS ÁS MARGENS? A CONSTRUÇÃO DA MARGINALIZAÇÃO NEGRA COMO MECANISMO DE DOMINAÇÃO

Tamiris Eduarda

3/26/20253 min read

INTRODUÇÃO

A questão sobre se as populações negras vivem à margem da sociedade ou se foram colocadas lá não é apenas um debate filosófico, mas uma realidade concreta que atravessa a história da escravidão, do colonialismo e das desigualdades estruturais que persistem até hoje. O pensamento de intelectuais como Frantz Fanon e W.E.B. Du Bois nos ajuda a compreender como essa marginalização não é fruto do acaso ou de uma "ordem natural", mas sim um processo ativo e intencional das estruturas racistas. Além disso, essa marginalização não opera apenas no espaço físico e social, mas também no campo psicológico, moldando subjetividades e limitando possibilidades de existência.

A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA MARGINALIZAÇÃO NEGRA

A exclusão da população negra dos espaços de poder e de decisão política é um elemento fundamental do racismo estrutural. Desde a colonização, o projeto de dominação europeia impôs não apenas a exploração econômica dos povos africanos escravizados, mas também a construção de uma narrativa que desumanizava esses sujeitos. Como explica Du Bois (1903) em As Almas da Gente Negra, o racismo impõe uma "dupla consciência" à população negra, ou seja, a necessidade de enxergar a si mesma não apenas a partir de sua própria identidade, mas também pelo olhar branco que a desvaloriza.

Após a abolição da escravidão, essa marginalização se manteve por meio de diversas estratégias, como a segregação espacial, as políticas de exclusão educacional e trabalhista e a criminalização da população negra. No Brasil, a falsa ideia de democracia racial ocultou essas dinâmicas, naturalizando a precarização das condições de vida da população negra e periférica (Nascimento, 1982).

A MARGINALIZAÇÃO COMO PRISÃO PSICOLÓGICA

Para além das consequências materiais da exclusão social, a marginalização também opera no campo psicológico. Frantz Fanon (1952), em Pele Negra, Máscaras Brancas, descreve como o sujeito negro, vivendo em sociedades colonizadas ou marcadas pelo racismo estrutural, internaliza a inferiorização imposta pela cultura dominante. Esse processo gera um conflito psíquico intenso, no qual o indivíduo negro pode acabar reproduzindo a visão racista sobre si mesmo, sentindo-se inadequado ou insuficiente.

A marginalização, portanto, não se resume a uma questão geográfica ou econômica, mas envolve a construção de um imaginário que reduz a autoestima, limita as ambições e, em

muitos casos, leva ao adoecimento mental. O racismo, como sistema de opressão, busca convencer a população negra de que seu lugar é à margem, e esse convencimento pode se transformar em uma aceitação inconsciente dessa condição.

A ILUSÃO DA MOBILIDADE E O PAPEL DA CONSCIÊNCIA RACIAL

Embora o discurso meritocrático sugira que o esforço individual pode levar qualquer pessoa ao sucesso, na prática, a população negra enfrenta barreiras muito mais complexas. Como afirma Du Bois (1903), a ascensão de indivíduos negros dentro de um sistema racista não significa necessariamente uma transformação das estruturas que marginalizam a coletividade negra. O que ocorre, muitas vezes, é uma incorporação de um pequeno grupo em espaços elitizados sem que isso altere as condições materiais da maioria.

Dessa forma, a saída da marginalidade não pode ser encarada apenas como um projeto individual, mas como um processo coletivo, baseado no fortalecimento da consciência racial e na construção de redes de apoio e resistência. Como aponta bell hooks (1995), a verdadeira libertação da população negra depende da capacidade de desconstruir os valores coloniais internalizados e criar novas formas de existência que não sejam pautadas pelo olhar do opressor.

CONCLUSÃO

A marginalização da população negra não é um fenômeno espontâneo ou resultado de uma suposta inferioridade, mas um projeto político e social construído historicamente para manter as relações de poder estabelecidas. Como demonstram Frantz Fanon e W.E.B. Du Bois, essa exclusão não se restringe ao campo material, mas se infiltra na psique dos indivíduos, criando barreiras subjetivas para sua emancipação.

Reconhecer essa realidade é o primeiro passo para combatê-la. A saída desse ciclo exige a construção de uma consciência racial crítica, baseada no resgate da identidade negra e na luta por espaços de pertencimento e poder. Como disse Fanon (1961) em Os Condenados da Terra, "cada geração deve, em uma relativa opacidade, descobrir sua missão, cumpri-la ou traí-la". A missão da população negra contemporânea é romper com a marginalidade imposta, não apenas ocupando espaços, mas redefinindo as estruturas que determinaram esses espaços.

Referências

• DU BOIS, W. E. B. As Almas da Gente Negra. [1903]

• FANON, Frantz. Pele Negra, Máscaras Brancas. [1952]

• FANON, Frantz. Os Condenados da Terra. [1961]

• HOOKS, bell. Ensinando a Transgredir. [1995]

• NASCIMENTO, Abdias. O Genocídio do Negro Brasileiro. [1982]